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segunda-feira, 1 de agosto de 2011

O FOTÓGRAFO DE ALMAS





É possível fotografar os pensamentos em sua nascente?
Dirão os leitores que fiquei louco ao colocar essa pergunta no início de uma narrativa. Posso sinceramente até estar mesmo sofrendo de certos discernimentos, mas na verdade, não me importo com os possíveis julgamentos dos que poderão criticar o que tenho para contar. Caso acreditem logo de cara, fica disso tudo uma história que pode ser real. Aos que se dispuserem a questionar (e acho isso excelente) fica igualmente meu respeito e espero que o gosto por um tanto dessa literatura nonsense chamada de fantástica da qual não tenho competência alguma para escrever.
Conheci-o numa praça, passava por ela todos os dias em minhas andanças de trabalho. Como meu serviço era mais na rua do que dentro de um escritório podia ter o prazer de apreciar o que na rua se via e também se desgostava.
Era pintor e fotógrafo. Expunha seus belíssimos trabalhos num mural na qual ele mesmo montava. Havia desde paisagens até figuras humanas. Eram pura magia as imagens que exibia como chamariz na cata de fregueses. 


O interessante era perceber um quê de vivacidade. Sempre se tinha a noção de que algo se movia e poderia sair do papel para ao lado dos passantes se colocar. Você, leitor pode dizer que isso é um tanto assustador. Poderia até ser, mas as imagens nada tinham de aterrorizantes. 


Nesse caso, intrigante mesmo não eram as  imagens, mas os homens fotografados ou pintados na condição de seres sempre contraditórios.

O fato é que amava o que fazia e deixava transparecer esse amor nas pinturas, nas lentes e nas revelações após toda uma busca que poderia levar dias de observação e esforço. 


Na correria muitos dos que passavam olhavam despercebidos, outros paravam e se interessavam.


 Eu fui um dos que aos poucos num dia parou para conversar e saí mais interessado do que talvez pudesse imaginar em toda minha simples e humilde vida até então.


 Contou-me um pouco de si.
Morava só. Havia se casado, mas por diversos motivos a relação tinha fracassado. Como resultado dessa união ficaram dois filhos. Garotos excelentes com quem partilhava seu amor e sua vida. Entretanto, além da profissão possuía um dom. Fotografando ou pintando ele conseguia retratar o pensamento de quem se dispunha a ser seu modelo.

Esta era a sua imprevisibilidade. Sua experiência de vida em observação era tão aguçada que conseguia desmistificar os pensamentos na fonte. Ver nesse sentido era imprevisível, estava além de uma plausível explicação.

Era interessante, porém perturbador, porque tinha horas que queria sossego. ‘Hoje queria fechar os olhos e não ver a fonte dos pensamentos de ninguém’, dizia, mas seu trabalho que também era seu prazer não deixava.


 Confessou-me que era a pele que permitia esse contato. ‘A pele é o maior órgão do corpo humano e tem um caráter mágico: ela é o contato do exterior que nos cerca com o interior que no homem habita através de suas diversas camadas: derme, epiderme, hipoderme...  Acho que a pele é porosa, deve haver brechas nela que podem ser penetradas por olhos mais sensíveis.Passei a perceber que é por meio dela que de alguma maneira consigo ir ao lago borbulhante das idéias antes de virarem palavras’. Confessou-me numa dessas horas de almoço
Quando um grupo de amigos meus resolveram testar o que eu dizia foram até ele pensando que comprovariam meu delírio. A partir de então, cada um desnudado e aconselhado por aquele homem, fotógrafo da praça, muitos começaram a se aglomerar na busca de mais do que uma foto. Queriam sugar seu dom e saber mais dessa fonte borbulhante. Eram pensamentos sobre amor, mágoas, ódios, desejos etc. Todos saíam com uma resposta e o homem exaurido.
Cada dia era uma leva de curiosos. De maneira muito misteriosa uma metamorfose começava a transparecer: ele já não conseguia voltar para casa devido ao cansaço e sua pele aos poucos se tornava cinzenta como cimento.
Pouco conversava agora com ele, pois estava sempre às voltas com curiosos. Não foi sem espanto que depois de um fim de semana ao retornar segunda-feira, no local jazia uma estátua humana tão viva quanto um ser humano. Era ele, o fotógrafo, transformado em monumento juntamente com suas imagens e pinturas eternizados como esculturas para apreciação da cidade.
Aos que tiverem dúvida resta-me apenas passar o endereço para que confirmem a veracidade da história:
Praça S. Luiz da Conceição entre as lojas de móveis Martinetto e a de calçados Zélion no município de Abartine/Minas Gerias.


ANDREIA CUNHA












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