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domingo, 13 de maio de 2012

GARGALHADA NO GARGALO




O Senhor Inácio sempre fora um homem sério. Suas atitudes condiziam com a austeridade de seu trabalho. Militar desde muito jovem, risadinhas não competiam com seu caráter.

Obvio é que tudo tem sua lição e seu aprendizado. Em sua adolescência antes dos rigores do quartel, sim ele ria bastante. Tirava sarro de colegas e não poupava sarcasmos e ironias quando a situação favorecia.

No entanto, com o passar do tempo e a maturidade incluindo nisso sua lida foram lhe trazendo claridade quanto aos comportamentos infantis e adolescentes a qual não mais condiziam com sua nova personalidade.

Austeridade, seriedade, sobriedade, aparente serenidade, muito siso e pouco riso foram se tornando palavras que conduziam como leme sua embarcação de vida.

Casou-se teve filhos e até mesmo nos momentos de maior descontração sempre adotava  o estilo continência para permitir que os filhos pudessem brincar. Ele jamais se liberava apesar de certo orgulho em ver as crianças em sua melhor fase.

Julgava que quando crescessem, assim como ele, adotariam uma postura mais austera. Nisso até que era compreensivo, pois não poderia permitir tanto militarismo até mesmo em seu lar. A atitude era dele embora com a mulher às vezes exagerasse.

O dilema viria agora já que em vias de aposentadoria teria a chance de se ver livre das rédeas ideológicas do regime militar. Mas isso são conjecturas dessa narradora que conduz como fios a história que está contando.

A mulher pensava que talvez com a aposentadoria, ele pudesse mudar um pouco ou quem sabe muito dessa forma de ver a vida. Esperançosa para ter um marido normal, ela assinalava os dias no calendário para o ocorrido como criança que espera o natal na ânsia de abrir seu presente favorito.

Quando enfim o dia chegou, foi dada uma festa na qual boa parte dos amigos compareceram para brindar o descanso merecido do Coronel. A festa decorria com alegria dos presentes que a demonstravam com risos e conversas. Do meio para o fim, com muito mais bebida, os convidados não mais riam, gargalhavam e berravam o nome do Coronel que levantado por seus subordinados fiéis comemoravam aquele momento solene.

A esposa ficou em intenso êxtase ao ver que os demais colegas de seu marido se permitiam liberar dos rigores do sistema a qual viviam. Ela, a mais contente de todas as mulheres, não se continha ao ver tanta felicidade.

O coronel meio alto (tanto no fato de ser levantado quanto o da embriaguez) batia continências aéreas e emitia comandos para os amigos que em saudosa ola o jogavam para as alturas batiam continência e ainda conseguiam pegar a tempo o Coronel voador.

Tudo aquilo era surreal aos olhos da mulher. Os filhos do casal não acreditavam no que viam, mas também movidos pelos líquidos sagrados riam desbragadamente de tudo o que acontecia como um verdadeiro espetáculo que merecia ser aplaudido e reverenciado.

Afinal não é todo dia que se vê um militar nas alturas como era o caso.
A festa não tinha fim de modo que muitos se esparramaram nos cantos da casa e dormiram por ali mesmo. O Coronel foi um deles. A esposa nem se importou e contente foi para seu quarto como se tudo aquilo fosse o princípio de uma nova vida.

No dia seguinte, o Coronel - que tem o hábito de acordar cedo -, se vê no meio da mais repleta balbúrdia e sem se lembrar do que aconteceu especificamente no dia anterior (referente aos momentos mais acalorados da festa), se assusta com tanta falta de disciplina.

Em meio a uma horrenda dor de cabeça e uma zonzeira inexplicável, levanta-se e começa a pôr todo mundo para correr. Os mais afoitos e desbaratinados saíram sem bater continência, os mais rigorosos perceberam estar diante de um líder e mediante o ato respeitoso se retiram rapidamente envergonhados por tamanha imprudência.

A esposa, assustada desce as escadas em desembestada correria e se depara com o velho Homem colocando a disciplina para funcionar. Para ela também sobrou um aviso: ‘Ponha já essa casa em ordem, você e todas as serviçais a qual pago em dia, caso contrário... ’

Tudo voltava a ser como antes independente da retirada do trabalho habitual em forma de aposentadoria.

Afinal para ele, Coronel, gargalhadas só e somente no gargalo.

Andreia Cunha





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