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terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

A FIDELIDADE DA TRAIÇÃO



Sempre foi fiel a seus princípios. Aprendera isso em sua infância com os pais rígidos em sua educação. Portanto, não adiantava vir com conversinhas sem fundamentos que caso ali estivesse escondida alguma intenção oculta, ele a perceberia e jamais a assinaria caso fosse essa a verdade.

Verdade é que em sua adolescência mostrou certa admiração pela extrema direita politicamente falando, talvez por medo de tudo o que vinha acontecendo  pelo mundo daquele momento. Um ar de guerra e intolerância pairava como nuvem escaldante sob  todos os habitantes do planeta.

Ele, por conta do serviço militar obrigatório, se encantou com a perspectiva da carreira da farda. Seus pais o elogiavam pois aprovavam essa atitude como uma bênção, a glória da nação. Tendo o consentimento familiar, seguiu o curso que tinha idealizado.

Nada foi extremamente fácil, também não, extremamente difícil. Seus princípios eram logo destacados pois mesmo que em detrimento próprio ele não se corrompia. Isso fez com que seu nome chegasse aos mais altos escalões, afinal era de homens assim que o sistema precisava.

Aos poucos e sob olhares ocultos e atentos a seu comportamento foi se achegando ao líder máximo do esquema. Nessa época, os ares de pavor quanto a uma guerra eram mais que eminentes. O mundo respirava a fumaça e derramava o sangue borbulhante em sua terra como água alimentando as plantas.

Devido as suas vocações científicas, seria um comandante dessa área, fazendo pesquisas com seres humanos – as mais absurdas e cruéis já feitas. Entretanto, não contava ver ali uma perspectiva sob outra ótica que não a do estudo e a progressão militar almejada.

Foi pego de surpresa ao se deparar com aqueles olhos verdes brilhantes apesar da magreza e tristeza profundas daquela criança. Algo nela lembrava seu ser, e pelos  olhos que via aquela igualdade latejante e pungente.

Isso o incomodava, pois não conseguia ir além nas pesquisas que deveriam continuar a todo vapor. Uma luz causava todo aquele choque e reconhecimento de si no outro. Tinha de fazer algo, mas agora já não seria para continuar naquilo.

Havia sido cativado nas conversasmesmo monossilábicas  que se permitiu com aquele ser. Teria de salvá-la a qualquer custo, mas isso teria seu preço. Passou a odiar-se pelos pensamentos que tinha e por vezes a odiar também os olhos verdes do menino.

O que o deixava tão vulnerável? Uma vontade de ser pai ou a de se ver na extensão daquela tristeza dilacerante nos olhos do menino?

Não, não poderia ser infiel. Estava ali para uma missão que lhe foi confiada e que lhe custara anos para conquistar – incluindo a confiança dos líderes do sistema.

Adiando cada vez mais o fazer científico, sem perceber demonstrava fraqueza – e esta era um defeito inaceitável para a raça pura que deveria  prevalecer pelo mundo.

Sua convocação era questão de tempo bem como sua dúvida crucial. Deveria ser fiel a seu desejo ou  a sua profissão?

Com um tiro foi exterminado pelo próprio amigo que lhe indicou a tal cargo e confiança. Só teve tempo de dizer:

- Só a traição e os olhos verdes me foram fiéis.

Seu corpo tombava  como árvore quando o segundo tiro alvejou-lhe a cabeça.

Andreia Cunha





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