Sonhei um homem...
Era perfeito dentro de suas possibilidades de perfeição. A
seu lado uma roupa de mergulho e mais adiante um escafandro, ambas a convidavam
para um mergulho. Cada uma dentro de suas condições de profundidade.
Ele, entre calmo porém um tanto ansioso para iniciar o sonho
narrativo, percebeu que logo ao nascer, teria que escolher uma ou outra. Tarefa
difícil justo para ele que viera ao mundo já adulto e pronto.
Pronto é palavra pretensiosa e isso só era justificado em suas estruturas
externas. Acolheu o escafandro como modo de mostrar que apesar da pouca existência
definida ainda por segundos era capaz de ir além dos limites do próprio criador
que o desafiava como narrador a tarefas aparentemente difíceis.
Não tivera infância, não sabia se teria figuras
representativas de pai e mãe e até irmãos. O que verdadeiramente importava era
aquele quadro na qual fora colocado e que por isso mesmo nascera.
Algo inexplicável começava a doer-lhe na alma. Era a dúvida
nascendo em seu coração e mente. O princípio do ponto de interrogação começava
em seu cérebro e se fixava no ponto vital de seu corpo chamado coração.
Vestiu o escafandro para que a dita dúvida em dor não o
consumisse em algo que tentava derramar de seus olhos. Mal sabia que um outro
antes dele já havia chorado o suficiente para encher um oceano, o mesmo o qual
nadaria agora.
Sem maiores ajudas adentrou a embarcação que o aguardava com
a equipe que o auxiliaria. Os integrantes pareciam entender o que deveria ser
feito e, por isso, muito mais experientes em vivência do que ele, marinheiro de
primeira viagem.
Nada fazia a dúvida parar de crescer dentro de si e já era o
momento de adentrar as águas primeiras até as abissais. A serenidade e os sons
do interior marinho seriam seus companheiros. Teria de lutar contra eles para
não enlouquecer sem as palavras que o haviam formado como criatura primordial
da comunicação.
Tarefa árdua a sua. Mas se fora criado para tal é porque em si
havia estrutura suficiente para enfrentar com destreza. Não sabia exatamente,
mas pensava assim para confiar em algo superior a tudo que teria de desempenhar
sem maiores verdades racionais.
Já não havia chão e as cenas ondulavam em seus olhos
recobertos pela proteção da roupa. Tudo era realmente divino naquele interior,
pena que poucos tinham a chance de ver...
Era comovido e estava tocado pelo Superno que o alimentava
com maiores surpresas. No entanto, a dúvida também o enchia como se furada a
roupa estivesse deixando aquelas águas sucumbirem seu ser...
Já era tarde para parar de derramar o líquido dos olhos, era
muita verdade para uma só existência e o oxigênio era retirado do ar, não da
água avisar os superiores não lhes daria tempo suficiente para retirar do
oceano sem totalmente ser inundado pela próprio oceano que de si brotava em
lágrimas, suor, urina e sangue.
De modo que se deixou inundar ali como se aquilo fosse o
motivo de sua existência: avolumar as águas. Era verdade demais para um só
corpo frágil e sua mente desperta pressentia que a morte não se detinha ali
naquele corpo frágil e fugaz. Entre um misto de felicidade e angústia produzida
pela dúvida que agora formada e brilhante se desprendia em onda e peixes o
consumia e o elevava a condição de mestre.
Entre nadas que nadam começou sua nova existência.
Andreia Cunha
Brilhante, sublime, tocou-me como o cavaleiro dos espelhos tocou Quixote.
ResponderExcluirBeijos doce professora.