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domingo, 11 de março de 2012

ENCONTROS E VERDADES



Há tantos caderninhos pequenos como este, na qual se pode facilmente manter à cabeceira para qualquer imprevisto mental em lampejos de ideias... Agora sei pelo menos um modo de agir...
Da autora

Lá estava ela pensando no nada a espera no ponto do ônibus, por sinal lotado como todo ponto deve ser naquela hora matinal...
Bom recurso (diriam os chefes) para se fazer a digestão do café da manhã rápido e apressado.

Da casa, ao fundo próxima ao ponto, duas crianças saem chorando.

Teve a impressão de sempre vê-las assim: chorando com raros momentos de felicidade. No entanto, ali era como se as visse pela primeira vez. Não sabia, bem como também eu não sei, explicar o que acontece nessas terras distantes feitas pelos mais etéreos e voláteis pensamentos profundos da madorna...

Choram, porém baixinho, como que tentando se proteger de uma surra, sufocando a dor em amargura no silêncio, como meio de evitar mais sofrimentos desnecessários.

Uma senhora que espera pelo ônibus pega o mais velho no colo, afaga-o e procura entender o que havia se passado dispensando-lhe carinhos. O mais novo chora e pede a companhia do irmão companheiro de aflições e desesperos. O desejo do menor é retribuído pelo mais velho como se ambos apenas tivessem um ao outro como consolo dos infortúnios que viviam.

Do mesmo portão sai o pai, já bêbado e cambaleante balbuciando palavras torpes por vezes ininteligíveis,mas certamente ferindo a esposa que ainda o aconselhava a fechar o zíper da calça deixando evidente suas partes.

Mal ficando em pé ajustou-se jogando-se na tentativa de sentar nas revistas que ainda tentava vender na rua.

Buscou na memória e recordou-se dos meninos em rara alegria de criança distante do pai: elas corriam e riam sempre juntas. Queria fazer algo para ajudá-las, mas não sabia bem o quê.

O ônibus chega, a maioria corre para a última porta – a traseira – a intermediária se abre e é nesta que ela entra quase sendo esmagada pela imprudência do motorista que a fecha bruscamente.

Não sabia para onde ia e nem o motivo de estar vivenciando aquilo. Tudo acontecia como em um filme sem roteiro ou direção aparente.

Em terras excêntricas não se discute com o acaso, apenas vivencia-se como sendo o real. Passaram pelo que foi um rio caudaloso. Ela – tanto quanto eu – se entristeceu ao vê-lo minguado, poluído e destruído. Suas águas hoje fétidas, antes abrigavam peixes – vidas maravilhosas, ecossistemas inteiros. Hoje, merda pura, pensou em voz alta.

Construções eram erguidas com força – não total por conta do dinheioro também minguado do povo que ali vivia. Revimos mentalmente toda a beleza anterior do lugar num pôr-de-sol escandalosamente lindo.
Os pensamentos seguem com o ônibus interrompidos por uma parada na qual sobe uma mulher cantando. Parecia ser um mantra. Olhou e achou que era uma pedinte. 

Como estava com um pacote de pão, ela o abriu e perguntou a uma outra mulher a seu lado se talvez a que tinha entrado estava com fome e reivindicasse comida.
Enganei-me, enganou-se... Como resposta obtivemos um calma, você vai se surpreender.

Para não perder a nasca de pão, ela o deglutiu com a vontade de quem não se saciou antes de sair. Não era uma pedinte, a mulher era bela, alta e estava muito bem vestida num estilo indiano, talvez...

Explica sua presença e apenas para nos felicitar oferece gentilmente doces recheados sem nada em troca. Com ela, um pequeno rádio com músicas místicas, enquanto agradecidamente nos alimentamos com o maná vindos daquela figura angelical.

Ofereci-lhe do pão. Agora, mais felizes, os viajantes conversavam como se faltasse um gesto, um carinho para lhes facilitar o seguir cotidiano.

Desci numa perifeiria e já não mais desdobrada em outra figura sabia por que ruas deveria caminhar. Encontrei um rapaz que apenas conhecia como um grande escritor. Suas barbas eram abastadas e lisas como cabelos bem tratados e penteados.

Estava acomodado no chão, na rua olhando o movimento ou a falta dele por ser uma bastante tranquila. No fundo, parecia mesmo aguardar minha chegada de modo tranquilo sem se preocupar com o tempo.
Conversamos num nível profundo de conhecimento sobre as obras que havíamos lido e chegamos a conclusões inesperadas e interessantes.

Mediante tudo aquilo, naquele momento eu sabia, sim eu sabia: queria as crianças, queria cuidá-las como mereciam ser cuidadas. Eu as amava tanto quanto aquele conhecimento que estava adquirindo e partilhando com o escritor desconhecido e tão amado por mim em sua desconhecibilidade de mundo normal.

Fiz-lhe um pedido. Poderia beijá-lo, mas  não queria no rosto, a barba anestesiaria o contato, seria na boca, um selo. Um selo de amizade, de compromissos,  verdade e sobretudo Sabedoria. Ah, sabedoria.

Andreia Cunha








Um comentário:

  1. Amada Andréia,

    É tão gostoso ler você, sinto como se estivesse próxima, como se pudesse tocar o seu rosto com o mesmo carinho que tento tocar a sua alma.

    É um bem querer imenso o que sinto por você, é me preocupar com a sua saúde, é querer saber se já se recuperou, é tentar até mesmo imaginar na hora das postagens se estou conseguindo cativa-la, são tantos sentimentos que se resumem a uma única palavra...amor.

    Beijo você com a intensidade do meu desejo de vê-la sempre feliz e saudável.

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