- 'O doce mistério da vida nem sempre parece doce quando apreciado
tantas e tantas vezes. Porém, querendo ou não é dessa experiência que o paladar
é aguçado. Veja o caso dos degustadores de café e de vinho.
De algo teremos enfim de ser peritos, temos de nos degustar
para saber de que somos feitos e qual o teor dessas substâncias e essências.
Ninguém passa pela vida sem ter de se provar. Alguns com mais maestria outros
com menos talvez.
Nessa viagem adensada com ingredientes de dor e prazer há a transformação
do que,a princípio único e sozinho não se é, junto com o todo vir a ser.
Passa-se de mero açúcar, a massa que tomará forma com o que aos anteriores se
unirá'.
O mestre conhecia bem os segredos milenares da alquimia
culinária e com ela explicava os segredos não só de sua arte mas também do que
considerava vida. Seu amor pela gastronomia ultrapassava o mero praticar
corriqueiro. Via em cada prato a beleza de uma metamorfose como criação divina.
-'O verdadeiro trabalho é aquele que te faz se sentir um deus
(ou pelo menos semideus) perante a imperiosidade da total e divina criação do
mundo em plenitude'.
Suas aulas eram verdadeiros louvores e com isso podia
realmente dizer-se um vencedor. Quantos não desfrutavam desse poder de decisão
devido às intempéries da própria jornada. Ao se pegar pensando nisso, uma
contradição vaga o iluminava: não que fosse superior, mas gostaria muito de ver
menos diferenças entre seus semelhantes.
Talvez tivesse sido agraciado embora preferisse não pensar
assim por achar arrogância. Provavelmente a tinha e reconhecia esses momentos
justamente nessas contradições mentais. Ao menos, a reconhecia. Percebia também
que nesses momentos construía querendo ou não uma massa com todos os
sentimentos como ingredientes.
Era com os sentires na cabeça que deveria trabalhar para os
provares alheios. Ele, semideus, deveria trazer à realidade nova gostosura a
ser apreciada. Parecia insano seu pensar por isso por inúmeras tentativas a
massa desandava e novamente em ciclos deveria recomeçar a receita até chegar ao
ponto ideal do não fracasso.
Na cozinha um sucesso, na mente a eterna tentativa e os
medos de não errar seja na falta ou no excesso. Afinal o resultado dessa nova
tentativa tinha já até um nome: PER FEIÇÃO.
andreiACunha
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