Até que
ponto eu penetro dentro de uma personagem e ela dentro de mim, não é fácil
dizer.
Cacilda
Becker
Sempre que pretendia começar uma nova história, lembrava-se
de Tzinacan, mago religioso encarcerado por Pedro de Alvarado, que mediante
lutas e batalhas buscava a escrita do Deus. Nada nesse sentido de começar lhe
era fácil, perecia mesmo ter de enfrentar o medo do tempo, do espaço ínfimo do
fosso de pedra e do jaguar com o qual dividia o espaço separado apenas por uma
janela ao nível do chão.
O nascer por escrito, por demais dolorido, representava o
medo do que na escrita se prefiguraria como contação. Afinal, ele, narrador,
era criatura criada apenas para isso: se expor nas mãos de um Pedro de Alvarado,
que como alguém real lhe daria a luz. Seu fosso era na mente de outrem – se seria
participante de fatos ou ficção, se saberia ou não de todos os pensamentos dos
participantes da narrativa, se vilão ou protagonista...
Seu destino não era o seu por escolha própria, querendo ou
não estava nas mãos de um deus provisoriamente dono das palavras que o animaria
para a composição da partitura, do compasso, da melodia...
Suas atitudes – comoventes, indecentes, condizentes ou não
com a moral eram apenas questão de estalos mentais dessa imensa fogueira que
habita a alma humana denominada criação. Nessas horas é que sentia o estalo da
matéria de que era feito, a madeira sendo consumida pelo fogo mental que não
cessa em produção. O jaguar com o qual divide o espaço é metal e facilmente
após derretido passaria pelas frestas da janela encostada ao chão refazendo-se
talvez para o destruir.
Enquanto houvesse história, oxigênio como combustível, o
fogo arderia e ao meio dia o idoso determinado para a função ergueria e
baixaria por meio da roldana o alimento que evitaria a morte antes do tempo
determinado por seu algoz.
O problema maior de Pedro de Alvarado é lidar com sua
potência dita como divina, enquanto semideus, ele desconhecia em profundidade o
que realmente anima seu pensamento criativo. Escrevia sim, dava vida a inúmeros
narradores, mas a fonte chamada de musa inspiradora era vista como Santa tal
qual as imagens nas igrejas.
Nesses momentos é que misteriosamente havia a fusão de todos
os seres tanto Criador quanto criaturas.Muito ainda havia para que enfim o
autor pudesse descobrir a origem das
origens que o trazia à tona para animar tantos e mais tantos outros narradores.
Eram nessas que mesmo a contragosto do algoz sabia que
inúmeros outros narradores continuariam a nascer assim como ele agora
demonstrando toda a falibilidade, fragilidade bem como genialidade desse ser
real e surreal que se intitula autor.
andreiACunha
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