Amo a liberdade, por isso deixo livre tudo que tenho…
Se voltar é por que conquistei, se não voltar é porque nunca possuí!
anônimo
Adolescente, ele resolveu peregrinar pelo mundo a procura de entendimento e também surpresas.
Por que não incluir aventuras nessa empreitada? Seria muito bom voltar, caso fosse esse o seu destino, com uma bagagem repleta de histórias para contar.
Esse pensamento retomava sua mente bem no meio de um vale alaranjado com tons de marrom cercado por montanhas rochosas e sem vegetação que se afunilavam conforme seguia adiante.
Seus passos eram o seu presente e nada melhor que suas pernas em ritmo compassado para marcar o tempo que vivenciava. Chegou já ao anoitecer a um suposto abrigo.
Não podia dizer casa, pois ficava dentro de uma das rochas. Lá habitavam quatro mulheres. Foi bem recepcionado, pois as duas senhoras mais velhas já o aguardavam como resultado de uma profecia de seus ancestrais que com certeza não a deixariam na mão. O cumprimento desta viria nem que fosse com a outra geração.
Ao ver as jovens, da que tinha cabelos pretos e longos se apaixonou. Seu percurso até ali foi recontado e nesse diálogo sentiu-se pronto para repassar o que peregrinou até então.
Havia recebido do pai um amuleto ainda não terminado. Era um símbolo mágico da liberdade e este seria esculpido conforme suas atitudes no mundo. Aquele ato paternal só veio a confirmar-lhe o desejo intenso de sair pelo mundo.
Muitos sinais seriam enviados a ele e isso era outro dos tantos conselhos recebidos pelos sábios de sua localidade. Sua missão era grande e teria de lidar com estranhezas e encontrar a coragem. O que não tardou a acontecer.
A primeira foi ter de entrar na região dos mortos sem luz. Corpos a céu aberto sem as devidas honrarias do ritual da morte. Ali encontrou uma peça de metal com os números 10-27. Julgou ser seu primeiro sinal, por isso somou seus algarismos. Sete mais dois nove mais um dez. Um era sua direção (norte) e zero a incógnita infinita do que representa viver.
Depois foram os lamacentos pântanos da ilusão repletos de cacos de espelhos e vidros. A seguir o vale seco que se fecha caso o peregrino não acerte o passo e vença as mentiras apresentadas como verdades.
Chegar àquele local ao anoitecer era um alívio e uma primeira verdade: havia superado até o momento os desafios.
As jovens o escutavam e a mesma sensação de paixão tomou a moça escolhida pelo jovem aventureiro. Por ela, ele faria tudo.
Entretanto, as senhoras anfitriãs o advertiram de que teria ainda que superar algumas verdades supostamente vencidas para adquirir a paciência – dom supremo dos vencedores. O prêmio para tudo aquilo ainda era um segredo e talvez assim permanecesse até o último dia de sua vida.
No decorrer dos dias, outro jovem apareceu e da outra jovem se apaixonou. Ambos tinham caminhos semelhantes. A missão agora era a de vencer as ansiedades da paixão. De alguma forma um sentimento de competição era colocado em choque.
A atenção das mulheres era um deles. Havia um limite imposto pelas mais velhas de que a aproximação com as jovens só se daria após uma missão a ser seguida, mas esta era enigmática e não seria exposta claramente. O terreno agora era o da incerteza.
Porém Alton Syis, o primeiro, não se conteve. Movido por intenso sentimento, na hora do jantar trocou diversos olhares com a amada e resolveu propor um brinde ao amor que ambos sentiam. Levantou-se e pegou o que seria um vinho e servindo somente aos dois, mediante a recusa dos demais, propôs um brinde.
Ao beberem, o líquido se transformou em algo podre. A moça sumiu e ele num ato em câmera lenta foi sendo petrificado de olhos fechados.
Jáfero Kolt e as demais mulheres ficaram sem ação. Para reverter o ato um disco foi lançado sobre a mesa e agora o enigma seria aos que em redor viviam. A atitude impaciente de Alton colocou-o a mercê da força e inteligência alheias.
Juntamente com o disco um mapa entre símbolos, desenhos e números. O que deveria ser alinhado na colocação daquele disco sobre o mapa? Números com números, símbolos com números e palavras?
As chances não eram infinitas, portanto qualquer tentativa fora dos limites da razão pensada seria um desperdício. Jáfero Kolt que antes sentia o mesmo ar de competição resolveu aliar-se ao mesmo pensamento de ajuda. Afinal poderia ser ele a ter caído na tentação.
O que se notou após a brilhante idéia de Jáfero era a de que o disco não se encaixava plenamente quando se tratava de misturar os sinais expostos no mapa. Ou eram símbolos, ou eram palavras, ou eram números.
Uma suposição já direcionava a uma possível solução. Dentre as mulheres, alguém se lembrou de suas aventuras e que um dos símbolos encontrados tinha números: o 10-27. E que tais números um dia serviram para direcioná-lo para onde hoje se encontrava.
Enquanto isso, Alton vagava na terra de pedras, perdido, desorientado sabia que tinha se precipitado na paixão e que por fim se deixou controlar por tal sentimento. Suplicava perdão e misericórdia, pois não havia entendido que apesar dos vales e provas ainda não havia conquistado a paciência. Sua prisão no mundo das pedras era o momento de conquistar duramente o que antes havia por excitação havia ignorado.
Não conseguia chorar e a cada momento andar era mais complicado, visto que estava se solidificando naquele lugar. Um medo intenso o tomava e todo seu passado vinha como relâmpago iluminando o céu daquele local. Seu olhar se direcionava para cima. Um dos poucos movimentos que ainda possuía.
No mundo externo, a decisão tomada foi a de cercar os números com o disco e ver o que aconteceria. Na hora em que o disco se aproximou dos números, ambos se tornaram um só corpo.
Estes se intensificaram e ganharam sinais e se alteraram nos valores. Algo deveria ser calculado. A seqüência era: na parte superior 14 – 30, em linha paralela 20 e 30 e abaixo na altura do – 30 o número 23.
Os cálculos direcionavam como resultado 11. O místico onze que mostrava cada um em seu mundo e que antes deveria ser um único 2. Alton e a amada agora estavam distantes cada um em seu mundo paralelo. Deveriam ser dois, mas por impaciência não mais seriam...
O disco consumiu o mapa em labaredas giratórias de fogo, a moça reapareceu. Alton permanecia entre os dois mundos e travava um diálogo com um ser superior.
Desejas voltar? (...) Terás que duramente encarar uma condição. (...) A de ser apenas o amuleto da liberdade. Estás sendo moldado tal como a pedra que teu pai deste ao sair pelo mundo. Tu te transformaste nela pela desobediência e arrogância. (...) Aceito seu perdão, mas para tudo há um preço. Cada ato tem sua conseqüência. (...) Ou aceitas essa a que te proponho ou terás que ver tua amada em pedra eternamente. (...) Quanto a ti? Terás que ainda aprender um pouco mais nessa condição. Aceitas? (...)
Teria de dar valor ao tempo, teria enfim de aprender na dureza o que por amor lhe estava sendo dado.
A impaciência só colabora para afastar o que próximo está e não percebemos por inaptidão para as vitórias ainda obscurecidas pela nossa ansiedade.
Andreia Cunha