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quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

BOCA DE BRASA, BOCA DO INFERNO OU SIMPLESMENTE GREGÓRIO DE MATTOS





Conhecido como Boca do Inferno ou Boca de Brasa devido as suas críticas ferrenhas, Gregório de Mattos continua atualíssimo em comparação ao Brasil de hoje. Por isso, uma postagem especial a esse grande poeta barroco de influência não somente no Brasil como também em Portugal.

Fica igualmente a dica do filme abaixo:




Gregório de Mattos
Um filme de Ana Carolina Teixeira Soares
Com Waly Salomão, Marília Gabriela, Ruth Escobar e Guida Viana, Tonio Carvalho, Rodolfo Bottino, Eliza Lucinda, Xuxa Lopes e Virginia Rodrigues
2002 - 70 minutos
No século XVII, na Bahia, surge o poeta que irá anunciar, com sua trágica vida e sua impressionante obra, o perfil tenso e dividido do povo brasileiro Gregório de Mattos, o Boca do Inferno (1636 – 1696).




O filme não é a reconstituição dramática e real de sua vida.
São momentos de sua vida na força desmedida de seus versos.
O imenso Gregório de Mattos - inadaptado contumaz - cria situações desconfortáveis para os poderosos e, desafiador, declina os cargos que lhe são confiados. Cai em desgraça e nada mais lhe resta senão encarar as horas amargas da vida na colônia.
Sibilando, tenta adaptar-se à Bahia que reencontra, espoliada pelo comércio português, pelos agiotas e pelas injustiças. Quadro vivo de um país começando a se fazer.
É aqui, com suas sátiras e eróticas, que Gregório de Mattos vai revelar sua genialidade criando a representação artística da vida brasileira, esculpindo com cuspe e fogo as matrizes de nossas diferenças, engendrando o encardido ninho de nossa identidade.
É aqui que seus versos vão desassossegar a Igreja, o Rei, os poderosos e assanhar o povo.
É aqui que Gregório será sacrificado, degredado e condenado a uma morte miserável e anônima.
É aqui que ele romperá a cadeia do esquecimento e vai reaparecer, moleque, totalmente identificado com este povo e por este povo identificado.
Epílogos

Que falta nesta cidade?................Verdade
Que mais por sua desonra?...........Honra
Falta mais que se lhe ponha..........Vergonha.

O demo a viver se exponha,
Por mais que a fama a exalta,
numa cidade, onde falta
Verdade, Honra, Vergonha.

Quem a pôs neste socrócio?..........Negócio
Quem causa tal perdição?.............Ambição
E o maior desta loucura?...............Usura.

Notável desventura
e um povo néscio, e sandeu,
que não sabe, que o perdeu
Negócio, Ambição, Usura.

Quais são os seus doces objetos?....Pretos
em outros bens mais maciços?.....Mestiços
Quais destes lhe são mais gratos?...Mulatos.

Dou ao demo os insensatos,
dou ao demo a gente asnal,
que estima por cabedal
Pretos, Mestiços, Mulatos.

Quem faz os círios mesquinhos?...Meirinhos
Quem faz as farinhas tardas?.........Guardas
Quem as tem nos aposentos?.........Sargentos.

Os círios lá vêm aos centos,
e a terra fica esfaimando,
porque os vão atravessando
Meirinhos, Guardas, Sargentos.

E que justiça a resguarda?.............Bastarda
É grátis distribuída?......................Vendida
Que tem, que a todos assusta?.......Injusta.

Valha-nos Deus, o que custa,
o que El-Rei nos dá de graça,
que anda a justiça na praça
Bastarda, Vendida, Injusta.

Que vai pela clerezia?..................Simonia
E pelos membros da Igreja?..........Inveja
Cuidei, que mais se lhe punha?.....Unha.

Sazonada caramunha!
enfim que na Santa Sé
o que se pratica, é
Simonia, Inveja, Unha.

E nos frades há manqueiras?.........Freiras
Em que ocupam os serões?............Sermões
Não se ocupam em disputas?.........Putas.

Com palavras dissolutas
me concluís na verdade,
que as lidas todas de um Frade
são Freiras, Sermões, e Putas.

O açúcar já se acabou?..................Baixou
E o dinheiro se extinguiu?.............Subiu
Logo já convalesceu?.....................Morreu.

À Bahia aconteceu
o que a um doente acontece,
cai na cama, o mal lhe cresce,
Baixou, Subiu, e Morreu.

A Câmara não acode?...................Não pode
Pois não tem todo o poder?...........Não quer
É que o governo a convence?........Não vence.
Que haverá que tal pense,
que uma Câmara tão nobre
por ver-se mísera, e pobre
Não pode, não quer, não vence. 


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As Cousas do mundo 


Neste mundo é mais rico, o que mais rapa:
Quem mais limpo se faz, tem mais carepa:
Com sua língua ao nobre o vil decepa:
O Velhaco maior sempre tem capa.
Mostra o patife da nobreza o mapa:
Quem tem mão de agarrar, ligeiro trepa;
Quem menos falar pode, mais increpa:
Quem dinheiro tiver, pode ser Papa.

A flor baixa se inculca por Tulipa;
Bengala hoje na mão, ontem garlopa:
Mais isento se mostra, o que mais chupa.

Para a tropa do trapo vazio a tripa,
E mais não digo, porque a Musa topa
Em apa, epa, ipa, opa, upa.


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