Ele não sabia o que em si acontecia. Tudo a sua volta era um
grande mistério e para sua sobrevivência, todos os dias tinha que arranjar
instrumentos feitos em pedra para derrubar uma fera, tirar-lhe a vida para
consumir suas carnes como se assim estivesse consumindo também seus poderes e
forças.
Estranho mesmo era sonhar em suas noites após o cansaço
vindo com o cair do sol - sempre em momentos diferentes de tempos em tempos- e
entender os motivos do frio e do calor ainda inexplicáveis a sua mente voltada
para o matar e o comer.
Se não fosse o caçador seria a caça e isso lhe causava medo
extremo embora nem soubesse o que era tal sensação. O ritual diário da vida: o
sacrifício, a expiação de seus atos e a renovação de suas forças no ato de
consumir o morto para sua vida.
Era entre pesar e desentendimento que procurava entender o
mundo e por isso o representar em sua
caverna os animais maiores que no dia seguinte deveriam ser enfrentados para ainda assim se manter vivo.
Numa dessas noites, após a construção de uma cena religiosa
em forma de pintura rupestre, ouviu um tambor persistente pulsar-lhe a mente
partindo de seu corpo. Julgou ser de fora e com tocha em mãos saiu pronto para
guerrear. Nada. Nada constava.
No entanto, o tambor rufava ritmado e também ritmando suas
veias e mente. Nunca sentira isso antes, era algo transcendente e mágico.
Desdobrava-se no ser que entre caçador e caça se via prefigurado naquela cena
que desenhava fora dela. Se via narrador pronto para contar a quem viesse como
amigo o que com o passar dos dias lhe acontecia
como verdade.
A bola de fogo, as feras gritantes, as armas e as estratégias
para fazê-las tombar ante sua astúcia. Era um círculo o que envolvia seu
desenho na pedra. Um bisão, um homem com pedras polidas e um círculo em volta
enquanto seu ser externo todo olho via com outra forma tudo o que acontecia ao
som do tambor que lhe estremecia as carnes.
Tomado por vento intenso, ele foi levado às alturas e
transportado à loucura do desconhecido no círculo que se desdobrava da imagem
na parede. Intensa energia mantinha seu corpo inerte, mas sua mente acesa em
fogo visceral. O tambor ardia em brasas e seu corpo correspondia...
Andreia cunha
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